“O Despertar das Feras” marca o recomeço da série “Transformers”. Um retorno que, honestamente, não é nenhuma surpresa. Trata-se, afinal, de um produto valioso e rentável. Alguns estão nas prateleiras. Outros, em um cinema perto de você.

O que espanta, contudo, é o hiato de cinco anos entre o novo filme e a última aventura. “Bumblebee” tentou, em 2018, diminuir o escopo da série numa tentativa genuína e, vá lá, razoavelmente bem-sucedida em injetar um pouco de personalidade aos heróis e vilões, robóticos ou não.

“Bumblebee”, contudo, não faturou metade da fortuna arrecadada por cada uma das cinco produções anteriores, todas dirigidas com a sutileza de um mamute por Michael Bay. A missão do diretor Steven Caple Jr. era, portanto, encontrar um meio termo e reconfigurar a série com barulho e com emoção.

A balança, no entanto, mal se moveu. “O Despertar das Feras” arrisca em vão um texto mais sólido para seus personagens, e é bem-vinda a tentativa em pincelar mais diversidade em seu elenco. Se não existe aqui o senso de destruição e espetáculo dos filmes de Bay, ao menos o filme se livrou de seu senso de humor inapropriado, do fetiche militar e do sexismo explícito.

Ainda assim, não existe valor nutritivo entre as batalhas de robôs gigantes – que continuam brutais até o limite de um filme infantojuvenil. A trama é basicamente uma refilmagem do primeiro “Transformers”, o melhor da série nem que seja por seu ineditismo. Existem robôs do bem e robôs do mal em busca de um artefato do juízo final, com humanos desavisados no meio do caminho.

O protagonista é Noah Diaz (Anthony Ramos, dos musicais “Hamilton” e “Em Um Bairro de Nova York”), veterano do exército que, agora civil, tem dificuldade em conseguir um emprego. As circunstâncias o levam à pesquisadora Elena Wallace (Dominique Fishback), que por sua vez tenta descobrir a origem de uma estatueta com símbolos alienígenas que termina no museu em que ela trabalha.

Não demora para ambos se encontrarem em meio a uma corrida para salvar o mundo, com os Autobots de Optimus Prime (o líder dado a discursos sobre honra e sacrifício) aliando-se aos Maximals, robôs que viram animais liderados por Optimus Primal (ei, eu só coloco os nomes aqui). Do outro lado da peleja está Scourge, chefe dos Terrorcons (é nome de brinquedo, relaxe), que busca uma chave energética capaz de abrir um portal para seu mestre Unicron, um robozão do tamanho de um planeta que quer devorar a Terra. Literalmente.

Assim como os outros filmes da série, o roteiro incompreensível continua no jardim de infância. Acompanhar a trama é como assistir a dois garotos bolando uma aventura no quarto com sua caixa de brinquedos. Cada personagem é construído em conceitos absolutos do bem e do mal, sem nenhum espaço para nuances que, acredito, ajudariam a plateia a ter algo para se agarrar. As adições ao cânone são ora cansativas, ora absolutamente sem sentido.

O anti-herói com passado militar, por exemplo, é uma convenção embolorada. Já os robôs animais são incoerentes até para um exemplar da série: eles vêm de outro planeta e ainda assim tem a forma de bichos da Terra. Bumblebee, o Transformer mais popular, vai para o estaleiro logo no começo do filme, tendo a posição de robô bacana e amigo do herói tomada por Mirage, um Porsche falastrão.

Embora continue ancorado no tema “cada um é muito mais do que aquilo que aparenta”, essa máxima não se aplica a “Transformers: O Despertar das Bestas”. Assim como seus antecessores, o filme continua sendo um comercial gigante para vender brinquedos. Tudo bem, é fantasia, a gente passa um pano. Mas fica difícil até dizer que, se eu tivesse 12 anos, seria a aventura do ano: para essa turma, o topo do pódio já é de “Super Mario Bros. – O Filme”.